Terça-feira, 31 de Julho de 2012

Tenho tido pouco tempo para escrever aqui no BOOM or DOOM mas li uma notícia que me deixou intrigado e aproveito para partilhar.

Germans 'better off without euro' - poll @ The Telegraph

Isto deixa-me apreensivo. Se os alemães acham que estariam melhor sem o euro então o euro é/era do interesse de quem?

O problema é mesmo esse. Está tudo ao contrário - o euro foi bom para os alemães ressuscitarem a sua economia que estava estagnada nos anos 90 e agora nem os alemães querem o euro. Das duas uma, ou estão mal informados ou acham que já usufruíram do euro o suficiente; eu aposto na primeira hipótese.

E o outro lado do problema está nos países do sul - esses sim deveriam estar a favor da saída do euro mas não estão (pelo menos não maioritariamente ou não assumidamente). Verdade que as alternativas políticas aos pró-euro podem não ser fáceis de aceitar pela maioria da população mas o que está em causa são as políticas dos próprios partidos pró-euro. A economia portuguesa, nomeadamente, está a atravessar a crise mais severa da sua história. As políticas que estão a ser seguidas insistem em ignorar os ensinamentos da história e, assim, vai continuar a fazer-se história.

  



publicado por Mais Um Economista às 10:50 | link do post | comentar | ver comentários (2)

Quarta-feira, 18 de Julho de 2012

No passado escrevi sobre o facto das previsões que têm sido feitas acerca da economia são sempre optimistas e acabaram sempre por ser revistas em baixa -  Mais Previsões Optimistas.

O FMI publicou ontem o relatório da 4ª revisão do programa de ajustamento e não é que a previsão do PIB foi revista em alta. Mas a imagem dos nossos próximos 6 anos continua péssima. Na realidade, a revisão é essencialmente no crescimento deste ano que passou de -3,3% para -3%. O gráfico evidencia que estamos claramente a atravessar A Nossa Grande Depressão e que esta revisão não altera basicamente nada - só em 2016 voltaremos a ter o PIB num nível semelhante ao de 2007.

  

 
E se houve realmente uma revisão das previsões, isso aconteceu na Taxa de Desemprego. Aqui sim as diferenças são brutais e o FMI reconhece agora que a taxa de desemprego deve atingir os 15,9% em 2013. De referir que o Governo, a OCDE e o Banco de Portugal têm previsões mais pessimistas - temos de esperar para ver.
 

 

 



publicado por Mais Um Economista às 13:17 | link do post | comentar | ver comentários (3)

Terça-feira, 17 de Julho de 2012

"A reestruturação da economia portuguesa" é mais uma das expressões que passou a fazer parte do dia-a-dia de todos os portugueses. Todos sabemos que saída da crise será à custa das "reformas estruturais" e os membros do Governo, principalmente o Primeiro Ministro e o Ministro da Economia, usam este argumento para tudo e para nada.

A meu ver, é certo que a economia portuguesa podia exportar mais do que exporta e que existe uma alocação de recursos por vezes ineficiente, fruto, em grande parte, duma legislação e duma política de incentivos desadequadas.

As "reformas estruturais" são necessárias e pecam por tardias, mas, lamento, não são aquilo que precisamos para sair da crise. São importantes para a economia no longo prazo, mas no curto prazo o seu impacto até pode ser negativo.

Para ilustrar o problema aqui fica uma versão de Paul Krugman duma metáfora primeiramente contada por Keynes aquando da Grande Depressão.

Imaginem que esta crise é como uma falha no sistema eléctrico de um carro, por exemplo o carro não pega porque a bateria "morreu". Ora, bastaria por uma bateria nova - operação relativamente simples e barata - e o carro estava de novo a funcionar. E com isto não estou a dizer que não haja outros problemas com o carro, alguns deles até problemas graves. Talvez o carro precise de travões novos ou uma nova caixa de velocidades, o que pode melhorar a performance do carro no futuro.

A questão é: que sentido faz não começar por substituir a bateria?

De volta à economia, o que precisamos de fazer para sair da crise é reanimar a procura. Isto precisa de ser feito ao nível mundial e mudar os travões ou a caixa de velocidades não adianta (as reformas estruturais); temos de desistir da austeridade e adoptar medidas expansionistas (mudar a bateria).

 

Senão vejamos um exemplo claro da impotência das reformas estruturais:

A reforma do mercado de trabalho que, entre outras coisas, irá diminuir as indemnizações por despedimento, visa promover maior entrada e saída de trabalhadores, garantindo uma mais eficiente alocação de recursos. Agora, esta alteração só se aplica a partir de 31 de Outubro de 2012 - não se aplica retoricamente.

Será que vai a tempo de ajudar Portugal a sair da crise? Claro que não. 

 



publicado por Mais Um Economista às 14:30 | link do post | comentar | ver comentários (2)

Segunda-feira, 16 de Julho de 2012

A Holanda juntou-se hoje ao grupo de países do euro (juntamente com a Alemanha, a Áustria e a França) que ultimamente tem usufruído de yields negativas na emissão de dívida pública.

O que isto quer dizer? Quer dizer que as taxas de juro da dívida pública destes países é inferior à inflação, ou seja, os investidores estão literalmente a pagar a estes países para lhes emprestar dinheiro.

Uma primeira observação, menos económica, leva-me a tocar num ponto relacionado com algo que me parece extremamente importante para o potencial funcionamento da zona euro, e que tem sido muito discutido - a criação das eurobonds, ou seja, a zona euro passar a emitir dívida pública como um todo.

A Alemanha opõem-se claramente às eurobonds e entretanto continuamos a assistir aos sucessivos bailouts dos países periféricos. Esses lbailouts, por sua vez, não são mais do que empréstimos que os restantes países do euro fazem ao país resgatado, sendo a maior parte do empréstimo coberto pela Alemanha, seguida da França, e por ai fora mediante a dimensão da economia. Portanto, como o dinheiro não surge do nada (até podia surgir se o BCE pudesse imprimir moeda, mas não pode), e não surge das eurobonds, os restantes países do euro têm de arranjar o dinheiro para emprestar ao resgatado.

Ora, colocando a questão da forma mais simples possível: a Alemanha vai ao mercado pedir dinheiro emprestado e fá-lo a juros inferiores a 2%; depois empresta o dinheiro a Portugal que recebe um bailout e paga juros superiores a 4% (fora as comissões pagas ao FMI, CE, etc.). 

Enfim, não acredito que a Alemanha se oponha às eurobonds por ganhar +/-2% com os bailouts aos países do sul mas que são +/-2% de lucro são. (Estas minhas não descrenças não são de hoje, nem de ontem.)

 

Quanto às implicações mais significativas e mais económicas das históricamente baixas taxas de juro, por um lado, os investidores estarão tão receosos que preferem pagar a estes países para lhes "guardarem o dinheiro" - um sinal claro de que a crise está a ser bem alimentada. Por outro, a única forma desta estratégia se tornar rentável para os investidores involve um ou uma combinação destes três acontecimentos:

1) as taxas de juro da dívida pública destes países descem ainda mais e os investidores conseguem vender a sua dívida a um valor mais alto;

2) a inflação desce ou temos mesmo desinflação, e portanto a diferença entre a inflação e os baixos juros da dívida pública destes países torna-se positiva, logo rendimentos para os investidores;

3) alguns países do sul saem do euro, o euro valoriza (ou o euro acaba, a Alemanha volta ao marco, o marco valoriza) e os investidores que estão fora do euro (ou da Alemanha) obtêm rendimentos pela valorização do euro (ou do marco).

As duas primeiras hipóteses sinalizariam que os investidores acreditam na manutenção do rumo actual dos acontecimentos - e consequente agravamento da situação económica. Já a terceira pode demonstrar que os investidores acreditam que o rumo terá de ser alterado e que tal estará para breve.

 



publicado por Mais Um Economista às 11:54 | link do post | comentar | ver comentários (1)

Sexta-feira, 13 de Julho de 2012

A Islândia é um caso muito interessante e uma experiência económica real que devia ser mais conhecida - não o é por razões óbvias: a Islândia fez tudo aquilo que não era suposto contrariando o poder económico instalado.

A Islândia não salvou os seus bancos, declarou default nas dívidas dos bancos ao exterior e apenas garantiu os depósitos domésticos, disse não à austeridade, desvalorizou fortemente a sua moeda, e (mesmo assim) recebeu um empréstimo do FMI tal como Portugal, Grécia, Irlanda e Espanha.

De referir que a Islândia foi dos primeiros países a ser afectado pela crise e a dimensão foi astronómica.

Os três maiores bancos da Islândia tinham uma dívida ao exterior de cerca de 50 mil milhões de euros, quase 600% do PIB.

Até que a bolha do sector bancário, criada à custa da total desregulação do sector, acabou mesmo por rebentar entre finais de 2007 e 2008. 

O gráfico abaixo mostra a evolução do índice bolsista islândes que ajuda a perceber a dimensão do problema.

Evolução do índice bolsista da Islândia OMX15

File:OMXI15.jpg

 

É claro que a crise na Islândia tinha todas as condições para ser muito mais severa do que a crise em Portugal - e foi, mas já deixou de ser. O PIB caiu drasticamente na Islândia em 2009 e 2010, enquanto que em Portugal a recessão de 2009 foi logo seguida de crescimento económico em 2010.

O problema surge depois, numa altura em que a Islândia começa a recuperar assente na desvalorização cambial e acompanhada por um empréstimo do FMI que assentava essencialmente em medidas de reestruturação do sector bancário, Portugal e o resto da Europa, viraram a sua atenção para os défices públicos, a austeridade passou a liderar as políticas económicas na Europa e mesmo nos EUA - os resultados estão à vista.

Depois de uma queda muita mais acentuada, a economia da Islândia já terá ultrapassado Portugal em termos de recuperação económica face a 2008. De referir ainda que enquanto as previsões para Portugal têm sido revistas sucessivamente em baixa, a Islândia têm constantemente superado as metas e estas previsões podem pecar por pessimistas (por exemplo: actualmente espera-se que a economia islandesa cresça 2,8% este ano e a estimativa do gráfico é de apenas 2,4%).

 

 

E outro dado interessante é a evolução da inflação. É uma boa referência para quem teme que em Portugal a saída do euro e respectiva desvalorização do escudo estimada em cerca de 30/40% resulte numa subida de preços e numa perda de poder de compra também de 30/40%. A moeda islandesa desvalorizou mais de 55% entre Julho de 2007 e Novembro de 2008 (portanto bem mais do que os 30/40% esperados para Portugal) e a sua taxa de inflação apenas foi anormalmente elevada em 2008 e 2009, e foi apenas de 12,4% e 12%. 

 

 

Sim, a Islândia é uma ilha gelada no meio do Atlântico e uma economia muito pequena e algo particular. Mas não nos podemos esquecer que a Islândia é também um país desenvolvido que estava a caminho de entrar para a União Europeia. As lições a tirar deste caso de estudo deviam ser definitivamente mais faladas e valorizadas.

 



publicado por Mais Um Economista às 12:08 | link do post | comentar

Há uns dias um comentário referia que a desvalorização cambial não convence e que pode não funcionar. Uma das referências feitas no comentário diz respeito aos EUA e como o facto do dólar estar fraco não ter ajudado a economia. Discordo - antes pelo contrário, o dólar fraco tem mesmo sido muito importante para a economia americana.

Prova disso é a performance da indústria. Segundo o Institute for Supply Management(ISM), em Junho de 2012 houve uma contracção da actividade económica na indústria, o que aconteceu pela primeira vez desde Julho de 2009 (ISM Report On Business - June 2012). De facto, muito se tem falado da resistência à crise do sector industrial nos EUA e certamente que um dos seus motores tem sido a fraca prestação do dólar. E mesmo comparando o crescimento económico dos EUA com o da Europa, a economia americana está claramente em melhor forma.

E se o caso dos EUA não é uma referência ideal para o que aconteceria em Portugal, basta olharmos para exemplos passados como o da Argentina ou exemplos presentes como o da Islândia, para ver que a desvalorização cambial funciona mesmo.

Quero escrever um post sobre o caso da Islândia mas aqui fica um artigo interessante do NYTimes.

 

 



publicado por Mais Um Economista às 11:08 | link do post | comentar | ver comentários (7)

Quinta-feira, 5 de Julho de 2012

Foi hoje anunciado o vencedor do Wolfson Economics Prize. Para quem não sabe, este prémio foi criado pelo Lord Simon Wolfson e desafiou economistas a apresentar as suas propostas para um plano de contingência para o fim do euro.

O vencedor foi Roger Bootle, em representação da Capital Economics, que apresentou o seguinte trabalho: Leaving the euro: A pratical guide. (O estudo tem 156 páginas pelo que quem quiser um resumo siga este link).

Eu ainda não li o relatório portanto não posso entrar em detalhes mas, pelo que posso ver no resumo, algumas das ideias do estudo são semelhantes ao que tenho defendido aqui no blog.

De referir que este prémio atribuiu ao vencedor nada mais nada menos do que 250.000£.

 



publicado por Mais Um Economista às 12:05 | link do post | comentar

Quarta-feira, 4 de Julho de 2012

Excelente artigo académico do conhecido economista Paul De Grauwe em co-autoria com Yuemei Ji. Os autores testam a hipótese de que os mercados de obrigações da dívida pública dos países da zona euro são mais frágeis e mais susceptíveis a self-fulfilling liquidity crises que os de países que emitem dívida pública na sua própria moeda. Os resultados são os esperados e de acordo com o que eu tenho defendido - Portugal e os demais sofrem de "negative self-fulfilling market sentiments" que agravaram a subida dos juros em especial desde finais de 2010.

Self-Fulfilling Crises in the Eurozone: An Empirical Test by Paul De Grauwe, Yuemei Ji

 

PS: As self-fulfilling liquidity crises referidas resultam do facto de países como Portugal não emitirem dívida na sua própria moeda, ou seja, não poderem garantir totalmente o pagamento dessa dívida porque, no limite, ao contrário dos países como o Reino Unido ou os EUA, não podem imprimir dinheiro para a pagar. Assim, os investidores ao temerem o default de um país como Portugal, exigem taxas de juro mais altas, e isso por si só torna default mais provável (daí o self-fulfilling) e pode gerar, como gerou em Portugal, graves problemas de liquidez.

 



publicado por Mais Um Economista às 17:17 | link do post | comentar

Em resposta a alguns comentários recentes, aqui vai um primeiro post.

Não foram os défices públicos que nos trouxeram até esta crise. Pelo contrário, os elevados défices e o crescimento das dívidas públicas no mundo todo foram consequência da crise. 

Para quem não concorda basta olhar para os casos como a Espanha ou a Irlanda que tinham as contas públicas mais do que em ordem. E mesmo Portugal tinha, em 2007, uma dívida pública de apenas 68% (apenas mais 3 pp. que a Alemanha).

Ora, em consequência da crise, isso sim, e uma vez que a primeira resposta, ao nível global, foi uma resposta no sentido correcto - aumento da despesa para reanimar a economia - aí sim os défices foram significativos, como tinham de ser. O problema veio pouco depois, quando os políticos das principais economias do mundo acharam que a crise era um problema já ultrapassado. Isto, aliado a uma preocupação crescente e infundada com as dívidas públicas levou os governos a cortarem cedo demais os apoios à economia e a recuperação esfumou-se. (Vejam este post com a história das conclusões das reuniões do G20 desde o inicio da crise

E sim, a preocupação com as dívidas públicas era e é infundada - senão recorde-se que os Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha, apesar de terem défices e dívidas públicas bem mais elevadas que em 2007, têm hoje as taxas de juro a níveis nunca vistos de tão baixos que são. E apesar dos países do Sul da Europa terem visto os seus juros aumentar não podemos confundir as coisas. Os juros de Portugal e dos demais aumentam porque os mercado perceberam há muito tempo que o euro, assim como ele é hoje, não tem futuro. Portanto, no caso de um breakup do euro todos sabemos o que aconteceria.

Nomeadamente, ao nível das taxas de cambio, países como Portugal sofreriam fortes desvalorizações contra fortes valorizações em países como a Alemanha, e podíamos mesmo ter um default parcial das dívidas de países como Portugal. É isso que os mercado temem e daí, nos últimos anos, as taxas de juro terem divergido tanto entre países como Portugal e países como a Alemanha. O que está em causa não é o tamanho exagerado do governos em Portugal ou na Grécia (que só por acaso é tão grande como na Alemanha). O que está em causa é Portugal como economia. Economia essa que dentro da zona euro actual não tem futuro e, como sabemos, a dívida externa de Portugal, tanto pública como privada, paga-se com o que a economia produz.

 



publicado por Mais Um Economista às 10:05 | link do post | comentar | ver comentários (2)

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