Quarta-feira, 04.07.12

Em resposta a alguns comentários recentes, aqui vai um primeiro post.

Não foram os défices públicos que nos trouxeram até esta crise. Pelo contrário, os elevados défices e o crescimento das dívidas públicas no mundo todo foram consequência da crise. 

Para quem não concorda basta olhar para os casos como a Espanha ou a Irlanda que tinham as contas públicas mais do que em ordem. E mesmo Portugal tinha, em 2007, uma dívida pública de apenas 68% (apenas mais 3 pp. que a Alemanha).

Ora, em consequência da crise, isso sim, e uma vez que a primeira resposta, ao nível global, foi uma resposta no sentido correcto - aumento da despesa para reanimar a economia - aí sim os défices foram significativos, como tinham de ser. O problema veio pouco depois, quando os políticos das principais economias do mundo acharam que a crise era um problema já ultrapassado. Isto, aliado a uma preocupação crescente e infundada com as dívidas públicas levou os governos a cortarem cedo demais os apoios à economia e a recuperação esfumou-se. (Vejam este post com a história das conclusões das reuniões do G20 desde o inicio da crise

E sim, a preocupação com as dívidas públicas era e é infundada - senão recorde-se que os Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha, apesar de terem défices e dívidas públicas bem mais elevadas que em 2007, têm hoje as taxas de juro a níveis nunca vistos de tão baixos que são. E apesar dos países do Sul da Europa terem visto os seus juros aumentar não podemos confundir as coisas. Os juros de Portugal e dos demais aumentam porque os mercado perceberam há muito tempo que o euro, assim como ele é hoje, não tem futuro. Portanto, no caso de um breakup do euro todos sabemos o que aconteceria.

Nomeadamente, ao nível das taxas de cambio, países como Portugal sofreriam fortes desvalorizações contra fortes valorizações em países como a Alemanha, e podíamos mesmo ter um default parcial das dívidas de países como Portugal. É isso que os mercado temem e daí, nos últimos anos, as taxas de juro terem divergido tanto entre países como Portugal e países como a Alemanha. O que está em causa não é o tamanho exagerado do governos em Portugal ou na Grécia (que só por acaso é tão grande como na Alemanha). O que está em causa é Portugal como economia. Economia essa que dentro da zona euro actual não tem futuro e, como sabemos, a dívida externa de Portugal, tanto pública como privada, paga-se com o que a economia produz.

 



publicado por Mais Um Economista às 10:05 | link do post | comentar | ver comentários (2)

Terça-feira, 19.06.12

Moedas paralelas e outras uniões monetárias

Algo se tem falado sobre a possibilidade de ser criada uma moeda paralela para a Grécia ou Portugal, ou mesmo separar o euro em dois, um para os países do sul e outro para os do norte. Existem ainda outras sugestões menos comuns de integração monetária como por exemplo juntar Portugal com os países da CPLP ou uma união mediterrânea entre o sul da Europa e o Maghreb.

Devo dizer que não sou a favor de nenhuma destas.

Começando pelas hipóteses como o euro a duas velocidades, a união monetária mediterrânea ou entre os países de língua portuguesa.

Em primeiro lugar, não nos podemos esquecer que estamos a assistir a uma experiência monetária que se revela cada vez mais como um falhanço. E não vejo que condições diferentes (e melhores) teriam tanto um euro a duas velocidades, e menos uma união monetária mediterrânea ou de língua portuguesa. Os pilares para o eficaz funcionamento de uma união monetária seriam mais uma vez muito frágeis. Nomeadamente: 1) insuficientes trocas comerciais entre os países da união; 2) ciclos económicos desalinhados; 3) fraca mobilidade dos trabalhadores; etc...

Penso que mesmo a solução mais falada, a do euro a duas velocidades, é muito pouco atrativa. Portugal, Espanha, Itália, Grécia e os demais países da dita periferia não teriam benefícios suficientes para continuarem a abdicar da sua política monetária em troca de partilharem a mesma moeda.

Quanto à possibilidade da criação de uma moeda paralela para países em dificuldades (para já fala-se do GEURO), penso que seria uma chamada second-best solution quando comparada com a saída total do euro. A ideia desta moeda paralela permitiria a necessária desvalorização cambial mas um ponto essencial é saber se a soberania sobre a politica monetária permaneceria ou não do lado do BCE. A trazer alguma estabilidade quando comparada com a saída directa do euro, sinceramente, só vejo esta solução a fazer algum sentido se for aplicado durante um período de transição até à entrada total da nova (velha) moeda.

 

Mais FAQ.Economia - Deixem comentários com o que gostariam de ver discutido.

 



publicado por Mais Um Economista às 12:49 | link do post | comentar | ver comentários (2)

Terça-feira, 05.06.12

Fala-se sobre a desvalorização do escudo. Porque é que ela aconteceria?

O escudo iria desvalorizar porque é exactamente para isso que Portugal sairia do euro. A necessidade de Portugal sair do euro prende-se precisamente na necessidade de desvalorizar a sua moeda e, como tal, isso aconteceria pelo simples funcionamento do mercado. 

 

Voltando um pouco atrás para tentar tornar isto mais claro.

A entrada de Portugal no euro resultou na acumulação, ano após ano, de défices externos elevados e, consequentemente, vimos a sua dívida externa aumentar brutalmente. Estes défices são fruto inegável da entrada de Portugal no euro na medida em que esta adesão originou uma grande e irracional diminuição dos custos de financiamento, para além do facto de Portugal ter passado a ter uma moeda forte e controlada por terceiros.

Ora, é certo que estes défices podiam ter continuado a existir e a dívida podia ter continuado a aumentar desde que o exterior continuasse disposto a emprestar-nos o dinheiro. Mas por diversas razões entre as quais a crise que começou em 2007/2008, o exterior deixou de querer emprestar a Portugal, o efeito do euro evaporou-se e os custos de financiamento, que tinham caído brutalmente com a adesão ao euro, começaram a aumentar também brutalmente.

Portanto, teoricamente só nos resta uma outra solução: eliminar os défices externos e começar a diminuir a dívida externa.

(Notem que quando me refiro a Portugal não me estou a referir só ao Estado, estes défices externos e a dívida externa são de todos: Estado, Bancos, Empresas e Famílias. E já agora, quando falo em externo e exterior refiro-me também a tudo que não reside em Portugal e que consiste também de Estados, Bancos, Empresas e Famílias.)

Então mas como é que eliminamos os défices externos?

Não há volta a dar, temos de aumentar as exportações e/ou diminuir as importações. E há (ou havia) duas formas de o fazer, uma mais díficil e outra mais fácil. A mais difícil é a que estamos a tentar agora, chamada "desvalorização interna". A outra, a mais fácil e a que foi usada por Portugal durante vários anos é a chamada "desvalorização cambial", que como sabemos, foi uma "arma" que deitámos fora ao entrar no euro.

Mas o que é exactamente uma desvalorização? E para que serve? E o que são a desvalorização cambial e a desvalorização interna? 

Uma desvalorização consiste pura e simplesmente em baixar o valor de tudo o que é doméstico, ou seja, produzido dentro do país. Significa portanto baixar o preço dos produtos nacionais quando comparados com os preços internacionais, logo tornar o país mais competitivo. Isto por um lado vai potenciar o aumento das exportações e, por outro, vai potenciar a substituição de importações por produtos nacionais.

E como já disse, podemos desvalorizar uma economia de duas formas, "internamente" e "cambialmente". Vamos usar o caso Português para ilustrar as duas.

Imagine que estamos em 1990 e que o nosso défice externo estava a aumentar para níveis indesejados, como acontece hoje, ou seja, temos de promover as exportações e desincentivar as importações. Como estamos em 1990, temos o escudo, e o Banco de Portugal o que faria era "imprimir escudos". E "imprimir escudos" não é mais do que dizer que cada escudo passa a valer menos, ou seja, desvaloriza o escudo face às outras moedas. E o simples facto do escudo desvalorizar é suficiente para automaticamente os nossos preços (que estão em escudos) ficarem mais baixos face aos preços no exterior (que estão em £, $, etc.), logo potenciar as exportações, desincentivar as importações,  etc... - isto é a chamada desvalorização cambial.

Mas estando em 2012, Portugal não tem moeda própria e, como tal, não pode fazer uma desvalorização cambial. Portanto a única forma de desvalorizar a economia é reduzir os salários e por essa via baixar os preços, potenciar as exportações, etc... - isto é a chamada desvalorização interna e é o que Portugal está a fazer (ou pelo menos a tentar).

 

Por fim, e respondendo novamente à questão inicial, a hipótese de sair do euro culminaria na desvalorização do escudo mas por mecanismos diferentes daqueles de 1990. Se Portugal voltar mesmo ao escudo, ninguém terá de intervir directamente para que o escudo desvalorize. Tal vai acontecer pelo natural funcionamento do mercado porque é mesmo para desvalorizar a economia portuguesa que o escudo será criado; e esse facto fará com que, pelo menos no curto prazo, ninguém queira ter escudos, e ninguém querer ter escudos significa que o "preço" do escudo desce, ou seja que o escudo desvaloriza. No limite, a haver intervenção da parte do Banco de Portugal, será para garantir que o escudo não desvaloriza demasiado (um efeito overshooting é expectável).

 

PS: A desvalorização interna tem vários problemas e limitações, e, muito honestamente, não está a funcionar assim muito bem. Vou ver se arranjo tempo para escrever sobre isto e mostrar alguns dados.

 

Mais FAQ.Economia - Deixem comentários com o que gostariam de ver discutido.

 



publicado por Mais Um Economista às 17:26 | link do post | comentar | ver comentários (7)

Segunda-feira, 04.06.12

A Economia é o tópico do momento. Todos os dias os telejornais abrem com a crise grega ou com a troika que chegou a Portugal e quer mais medidas de austeridade. O problema é que, como é natural, nem todas as pessoas sabem o suficiente de Economia para perceber muitas das coisas que se passam hoje em dia. É certo que todos sabem dizer se querem que Portugal saia ou não do euro; mas muito poucos percebem exactamente o que está por detrás de tal decisão. E para complicar um pouco, existem vários jornalistas e comentadores que influenciam a opinião pública com o que dizem ser o seu conhecimento económico mas que muitas das vezes acaba por ser puro desconhecimento.

Vou então criar uma série de posts com respostas a algumas perguntas e erros frequentes relacionados com Economia (FAQ.Economia).

E tenho a certeza que há muitas perguntas! Deixem comentários com o que gostariam de ver discutido!



publicado por Mais Um Economista às 14:03 | link do post | comentar | ver comentários (9)


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